Marisa Mathey
Marisa Mathey, Mãe, Mediadora de Conflitos, Advogada Colaborativa, Instrutora voluntária das Oficinas de Pais e Filhos certificada pelo CNJ, Voluntária da Ong Amigos do Bem e Pianista. marisamathey@uol.com.br
Recebi da minha ex-mulher ontem, uma mensagem de texto pelo meu whatsapp (75% dos casais se comunicam por este meio), dizendo que sua tia havia proposto que fizéssemos “Mediação”, que seria bom para a nossa família.
Fiquei nervoso e desconfiado, confesso! Ela pensa que sou bobo. Vem com esta conversinha furada para tentar pegar no meu ponto fraco. Primeiro que meu Advogado já disse que ela não tem os direitos que pensa ter e que eu não tenho que ceder a qualquer exigência dela porque a Lei me ampara, é só dar um telefonema para ele e no outro dia, ele ingressa com a ação judicial contra ela e nós ganharemos tudo, fácil.
Depois…tia dela? Ah! Só faltava esta, pensa que sou inocente, é claro que a tia ficará do lado dela! Mas, meu Advogado joga bola comigo todas as quartas-feiras, desde que estudávamos no ginásio, ele sim sabe o que fala, me conhece e gosta de mim, verdadeiramente.
Caro leitor, qual seria sua opinião se ouvisse esta história?
Ilustrei o caso acima para esclarecer, de forma simples, o que é Mediação e para que serve. Imagino que muitos de vocês podem estar passando por uma situação semelhante e nada como o conhecimento, traz libertação!
A Mediação é uma forma de auto composição que acontece com a ajuda de um Mediador, profissional habilitado para facilitar o diálogo entre duas pessoas que estão vivendo um conflito.
O Mediador é imparcial, não julga, não critica, não condena e nem sugere. Tem dever de sigilo, não trabalha com provas e caso seja Advogado de formação, estará impedido de advogar contra uma das partes que tiver atuado como Mediador, por razões éticas.
Ele trabalha com a narrativa das partes, num ambiente informal e acolhedor, em sessões com duração de 1 hora e 30 minutos, aproximadamente, ao redor de uma mesa redonda ou sofás, com água e café. Em média, 6 sessões acontecem para que as pessoas possam ter oportunidade de dialogar e construir algum consenso.
Às vezes, fazem o acordo no primeiro ou segundo encontro, mas são casos excepcionais, onde os Mediandos estão maduros em relação ao que querem, normalmente não estavam com o canal de comunicação fechado, logo já vinham trocando ideias e chegam ao Mediador para as negociações finais e a formalização do acordo.
O acordo não é o principal objetivo da Mediação, ele é uma consequência do entendimento que pode nascer destas conversas, vai depender da disposição das partes. Quando os pais separados, ou mesmo os que ainda vivem juntos estão nervosos, cansados do ciclo vicioso estabelecido pelo conflito intenso, normalmente, não conseguem respirar fundo e agir com a razão para encontrarem formas adequadas para solucionar os problemas. É indicado que procurem a ajuda de um profissional preparado, que poderá trabalhar para que este ciclo seja rompido e uma nova estrada seja aberta.
Como assim, Marisa?
Nós vivemos a cultura da sentença e estamos acostumados a terceirizarmos nossos conflitos para que outros os resolvam por nós. Na justiça ortodoxa, todos os casos que ingressavam no Poder Judiciário, eram resolvidos de uma forma apenas: pela decisão do Juiz.
Percebeu-se que as ações de família que chegavam ao Juiz, representante do Estado, traziam a ponta do “iceberg” e a sentença, apesar de ser proferida por profissional altamente qualificado, imbuído da melhor das intenções, não agradava a um dos litigantes e muitas vezes, a nenhum deles. Por que isto ocorre?
Um casal que viveu 20 anos juntos, por exemplo, quando se dissolve, cada um procurará seu advogado, contará sua história, este profissional a colocará no papel, de forma adversarial, muitas vezes violenta e quando estas versões chegarem às mãos do Juiz, a realidade estará totalmente fragmentada, não raro, muito tempo depois do ocorrido na vida real e novamente, um “terceiro” irá manejar o seu conflito, julgando de acordo com o pensa ser melhor para a sua vida.
Pergunto ao leitor: No caso de uma longa relação de família, quem será a pessoa mais apta a saber o que melhor funcionará no seu dia-a-dia, quando o assunto for, por exemplo, guarda de filhos e visitação: o pai e a mãe ou um estranho que não conhece a vida deste casal, suas crenças, seus costumes?
Na minha opinião e na cultura da Paz, a qual a Mediação é um instrumento, ninguém melhor do que os próprios pais, mas em função da falta de condição para conversarem e decidirem o que é melhor para seus filhos, retirando suas diferenças pessoais (raiva, melindres, ressentimentos, orgulho, frustrações), terceirizam seus problemas, ao invés de enfrentá-los com serenidade, equilíbrio e focar no melhor interesse dos filhos, que são os vulneráveis, especialmente se estivermos tratando de crianças e adolescentes.
Além disto, sabe-se que a Ação Judicial pode destruir vínculos familiares, de difícil reparação. Por isto, o Tribunal Multi Portas, idealizou nos Estados Unidos, uma porta de entrada na corte para todos os conflitos e várias portas diferentes para a solução destes, sendo a Mediação adequada para relações com vínculo duradouro, profundo, por exemplo sociedade, vizinhança, família.
O Mediador utilizará várias técnicas, de acordo com a necessidade, sendo que a Escuta Ativa sempre estará presente.
O ambiente pressupõe respeito entre os participantes, que precisarão aderir aos “combinados”, aceitando os requisitos, princípios, objetivos do trabalho e o preço quando este não for realizado em caráter voluntário, para que a Mediação possa ser iniciada. A voluntariedade, a boa-fé, a transparência, o respeito.
Uma das principais regras que deve ser seguida durante as sessões de Mediação é o respeito ao outro quando estiver falando. Cada uma das partes terá sua vez de falar, durante o mesmo tempo e o Mediador irá conduzir este equilíbrio para que nenhum dos dois interrompa o outro, nem o próprio Mediador.
O profissional irá mapear mentalmente o conflito em que estiver trabalhando, fazer investigação para que as necessidades e interesses dos Mediandos venham à tona e que um possa escutar ao outro.
É por isto que dizemos que o acordo não é o objetivo principal da Mediação, porque para ficar apenas no papel e não ser verdadeiramente aceito e cumprido pelos Mediandos porque na verdade, não expressava suas vontades, o acordo não interessa para a Mediação.
O Mediador auxiliará as partes para que elas encontrem a melhor solução para seus conflitos, elas serão protagonistas de sua história. Os acordos não são elaborados em cima de concessões e sim atendendo aos interesses e necessidades de todas as partes. Poderão ser provisórios e revistos de tempo em tempo para que as partes percebam sua funcionalidade e possam adequá-lo.
Mas, e os Advogados?
Estes profissionais são muito bem-vindos à Mediação porque eles é que irão informar seus clientes sobre seus direitos e deveres, esta não é a função do Mediador, ainda que sua formação de origem seja na área jurídica. Além disto, os Advogados poderão auxiliar a encontrar soluções alternativas e criativas na solução dos conflitos e elaboração dos acordos.
Caro leitor,
Se escolhemos luta, então poderemos chegar à vitória – um objetivo satisfeito -, mas esta significa um trabalho feito pela metade; com o risco de que a vitória venha a ser muito cara. Pode trazer consigo vingança, desforra, arrogância.
Contudo, podemos usar a nossa capacidade de transformação do conflito por meio da transcendência, usando novos métodos, darmos um salto e criarmos uma nova realidade, buscando mais saúde e qualidade de vida para nós e principalmente para os nossos filhos!
Pare e pense porque a plantação é livre, mas a colheita é obrigatória. As nossas ações têm consequências e devemos pensar antes de agir, afinal somos seres humanos únicos e diferenciados, não só pela capacidade de raciocínio, mas também pela capacidade de amar!
Marisa Mathey – Mediadora
Fonte da ilustração : Internet :” Homem Com Cara Irritada Que Fala No Telefone Celular Foto de Stock – Imagem: 73293669”
Seu endereço de email não será publicado.