O seio que alimenta em tempo de corona-vírus
Sem entrar no mérito da discussão de gêneros, uma das coisas do feminino que mais se diferencia sobre o masculino é a capacidade das fêmeas em amamentar seus filhos. Disso, pode se referir todo o desenvolvimento do bebê, desde o seu nascimento até sua maturidade, caso o aleitamento materno ocorra de forma adequada.
Eu, homem, pai de três filhos e avô de dois netos, quando observo mães amamentando, aprecio a relação que nasce desse ato que é a evolução do que já acontece desde a concepção. Ela continua se desenvolvendo, do ainda bebê, até todos os dias…
Mas, o que me encanta é a troca de carinho, ou seja, de cuidados entre ambos. Os olhares entrelaçados, o toque das mãos pequenas, sensíveis e curiosas sobre o seio que o alimenta, o aconchego num colo inesquecível mesmo que não se tenha lembranças diretas. Estas ficam na personalidade construída.
Nos dias conflituosos da contemporaneidade, ainda mais com o acometimento do corona-vírus e a imposição da quarentena, pretendo, portanto, destacar outro seio que alimenta. Já não é mais aquele que fornece o líquido divino. Já não é do calor e da suavidade de uma pele macia que pulsa no ritmo amoroso do coração da mãe. Mas também é um seio que alimenta, imuniza, humaniza e tem o calor suave do comprometimento do bem querer entre as pessoas. O seio o qual descrevo é a cozinha de uma casa. Sendo bem conduzida, ela abraça e acolhe a todos numa troca harmoniosa de responsabilidades.
Cozinhar, para humanos que se alimentam dos contatos, dos cheiros e dos sabores, é oferecer o seio no seu ambiente de convívio a dar prazer, calor e afeto. O seio materno produz o alimento, o qual não há como provocar alterações. O que muda é o afeto oferecido ao bebê. Já, na cozinha, as escolhas dos temperos e formas de elaboração dependem de todo o carinho e do conhecimento sobre quem se deseja alimentar.
O fogão acalorado pela chama do coração, pulsa no borbulhar da panelas, acompanhado de boas conversas e ajudas na elaboração do prato, na arrumação da mesa do jantar, no fato de ter alguém ali a ajudar no preparo do suco para acompanhar a refeição, representa o toque do bebê na suavidade de um seio que empurra seu líquido nos impulsos amorosos para a sucção. Isso sustenta as crianças, jovens, maridos e esposas das necessidades mais primordiais da vida humana: o alimento produzido com a energia do carinho no cuidado de uns com os outros.
As comidas rápidas que chegam à nossa porta nem sempre carregam alimentos calorosos de afeto ou com tempo de cozimento temperados por diálogo higienizados. O balanço durante o transporte não é como o embalar de um filho no colo, enquanto os braços mútuos mexem o pulsar da panela.
Quem diz que educar não depende do tempo, mas somente da qualidade do estar junto, se engana. O bom prato se faz com boas escolhas de ingredientes e com um bom tempo de cozimento. Educação se faz com tempo, repetição e com qualidade das relações estabelecidas.
Em tempos de corona-vírus é importantíssimo que nos avaliemos e aprendamos sobre a vida e nossas relações. Sendo assim, a calma, a criatividade e o compartilhar, serão fundamentais para que façamos da cozinha, o seio da casa, um ambiente rico, afetivo e caloroso, a produzir nutrientes relacionais que, mesmo que saiam de nossas lembranças, permanecerão fincados na personalidade de cada um para, assim, desencadear reflexos saudáveis em todas as relações, a partir desse período de confinamento dentro das próprias casas.
Márcio Macarini
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